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segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Alienação

Alienação
Luciano Palm
           A palavra alienação origina-se do latim alienus, etimologicamente significa outro, estranho, porém, em nossa cultura recebeu também conotações filosóficas, sociológicas, econômicas e psicológicas. Filosoficamente, a alienação consiste na experiência de estranhamento do ser em relação a realidade que o circunda. No séc. XIX, Marx dará os "contornos" sociológico e econômico para tal conceito, ao descrever a experiência dos trabalhadores em relação ao produto (resultado) de seu trabalho. E no séc. XX, Freud possibilitará uma interpretação psicológica do mesmo conceito. É bem verdade que todos os significados do conceito da alienação estão interligados e guardam semelhanças semânticas entre si, mas, por outro lado, também há sentidos específicos devido as particulariedades das disciplinas que o problematizaram.
          Filosoficamente não temos como precisar exatamente um filósofo específico que tenha desenvolvido o conceito da alienação, é claro que poderíamos pensar neste contexto em Marx como tal filósofo, mas deixemos a ele o encargo das definições sociológica e econômica. Mesmo antes de ser "batizado", de receber o nome específico, a alienação já era tema do discurso filosófico. Afinal, é exatamente a partir dessa experiência de radical estranhamento frente a realidade que surgirá a inquietação e o desconforto necessários para a reflexão filosófica.
            Contudo, acredito que tenha sido principalmente com Marx, no séc. XIX, que o conceito da alienação tenha entrado definitivamente para os círculos de discussão e se tornado um conceito relevante para a compreensão de mundo daquela época em diante. Uma compreensão rápida e superficial da alienação sob a perspectiva de Marx poderia ser dada da seguinte maneira: A alienação é uma experiência vivenciada pelos trabalhadores modernos (e também pelos contemporâneos), provocada sobretudo pela mudança dos modos de produção. Até o período medieval, a produção nas sociedades ocidentais se dava basicamente de modo artesanal, em que o trabalho era executado, na maioria das vezes, pelo mesmo trabalhador (ou por um pequeno grupo) do início ao fim do processo produtivo. Neste modo de produção era possível que os trabalhadores se identificassem com o produto do seu trabalho. Tal experiência não é mais possível no modo de produção industrial e capitalista, pois, na "linha de produção" cada trabalhador executa apenas uma pequena parcela do trabalho necessário para a produção de determinado produto (ou para a execução de determinado trabalho), transformando o resultado do trabalho em algo estranho para aqueles que o produziram. Além disso, o estranhamento entre trabalhador e resultado (produto) do seu trabalho é, na maioria dos casos, enfatizado por um aspecto econômico, em que o trabalhador se vê alienado (excluído) do uso e da propriedade de seu trabalho. Pensemos neste caso em um trabalhador da indústria automobilística, que todos os dias fabrica automóveis, e, no final do mês, o seu salário não lhe permite a compra de um automóvel sequer daqueles que ele ajuda a fabricar todos os dias. Ou então um trabalhador da construção civil, um pedreiro que ajuda a construir um prédio, e, ao final da obra, não tem dinheiro suficiente para comprar um único apartamento deste prédio.
           Além dos aspectos filosófico, sociológico e econômico (abrodados rápida e superficialmente até aqui), temos também a perspectiva psicológica. Psicologicamente, a alienação é caracterizada como uma perturbação psíquica, em que o indivíduo percebe-se como um outro (alienus) em relação a sua realidade. Não se pode confundir tal experiência com um distúrbio esquizofrênico por exemplo, em que o indivíduo cria realidades paralelas (embora, em alguns casos, possa evoluir para este quadro). A alienação psicológica consiste muito mais na percepção de descolamento da realidade, em uma percepção de não pertencimento radical do mundo e da realidade.
          Mas, por que refletir e falar sobre isso? Talvez neste momento o enunciado do antigo templo de delfos pudesse servir como resposta à questão: conhece-te a ti mesmo. Talvez esta seja apenas uma tentativa de exercitar o autoconhecimento e como tal exercício, já tem sua razão e dignidade de ser. Diálogos consigo mesmo são necessários para descortinar o ser atrás do homem, a pessoa atrás da máscara e o corpo além da imagem.

Um comentário:

  1. Sim, um òtimo texto!! Ao le-lo lembrei também da importancia de Feuerbach e do conceito de alienaçao religiosa por ele desenvolvido. Feuerbach dizia que existe uma alienaçao religiosa porque um elemento secundàrio, criado pelo homem, no caso Deus, passa a ser um elemento primàrio. Assim o homem passa a estar submetido àquilo que ele mesmo criou. Marx, se nao me engano, aplicou este conceito de alienaçao no ambito economico. Gostei muito do paràgrafo em que voce fala da alienaçao psicologica e, principalmente, da imagem que foi associada ao paragrafo. Acho que ficou bem explicada a alienaçao economica e de forma muito simples também a alienaçao psicològica, que acontece sem nos darmos conta.

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