Tatiana Palm
No
fim do ano-velho assisti ao filme 127 horas, que conta o que aconteceu na vida
real de Aron Ralston. Uma das cenas forte, dolorosa e decisiva foi aquela da
amputação do braço. Como escreveu certo dia Marta Medeiros, em sua coluna no
Jornal ZH, “o corte, o tão famigerado corte, no entanto, faz parte da solução não
do problema. São cinco minutos de racionalidade, bravura e dos extremos, mas
também um ato de libertação, a verdadeira parte feliz do filme, ainda que temos
dificuldade de aceitar que a felicidade pode ser dolorosa”.
No início do ano-novo assisti ao
filme “Comer, Rezar, Amar”, baseado na vida concreta de Elisabeth G. Do meu
ponto de vista, este filme pode ser uma sequência do outro no sentido de que o
outro permite a interpretação de que as amputações existenciais podem ser
necessárias, este, por sua vez, representa as amputações feitas e o que se
desencadeia a partir delas. Em “Comer, rezar, amar” a autora faz amputações no
que diz respeito ao amor (amor paralisante), a sua profissão, a sua cidade, da
sua existência desencantada. Os cortes são condição da continuidade do seu
existir em sentido verdadeiro, pleno e inteiro. É a partir dos cortes, que não
foram sem sangue, sem dor, sem medo ou sem insegurança, que a autora
ressignifica a sua vida, encontra a felicidade e também a sua espiritualidade.
As autoamputações são necessárias
quando queremos nos libertar do que aprisiona, adoece, imobiliza. As amputações
são dramáticas, porém, necessárias quando não queremos ser pessoas acorrentadas
às comodidades. A comodidade é o mal do nosso século. É um mal por ser contrário
ao movimento, que é o verdadeiro ser da vida que pulsa. É preciso, no fluxo
constante da vida, voltarmos a ser natural o que significa pôr-se em movimento
que, por sua vez, implica executar cortes, amputações de tudo o que é nosso mas
que deve deixar de ser.
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