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sábado, 12 de maio de 2012

Panis et Circenses


Panis Et Circenses
Luciano Palm
            A expressão latina panis et circenses (pão e circo) era o lema dos imperadores da antiga Roma no que se referia ao seu tratamento das políticas públicas. Além do legado jurídico romano, o lema dos antigos imperadores também atravessou os tempos e permanece com intensa vivacidade na cultura ocidental contemporânea. Nossa sociedade esta voltada para a dispersão, todas as placas, luzes e holofotes induzem nossa atenção para fora, a realidade exterior se apresenta com tanta ênfase que o nosso dentro (o íntimo de nossos seres, a essência do que somos) parece estar fora, bailando no ar da impessoalidade.
            Ao prestarmos atenção nos discursos cotidianos, veremos um EU, maiúsculo e insistente, ecoando sem parar nas bocas das pessoas. Mas na sociedade do espetáculo, no circo do parecer ser, mesmo a primeira pessoa do singular (eu) é terceirizada, é oca, sem conteúdo ou essência. O ritmo frenético da vida contemporânea, com seus excessivos apelos visuais e sonoros, aos quais somos submetidos diariamente cria um véu de maia, uma nuvem de poeira, que nos cega de tanto vermos e nos ensurdece de tanto ouvirmos. Há um oceano de informações e uma fonte seca de ideias e conhecimentos, a riqueza de estímulos externos contrasta com um imaginário miserável, somos pobres de tanto ter, nunca tivemos tantas coisas, nunca produzimos tanto, em contra-partida somos mendigos de nós mesmos, nos conhecemos tanto quanto nosso espelho que reflete uma imagem superficial e vazia. Chegamos ao absurdo de falarmos em humanização do ser humano, eis o maior paradoxo da atualidade.
            E esse verdadeiro circo dos horrores começa a ser armado desde a mais tenra infância, quando pais super-atarefados inundam o berço de seus filhos com chocalhos, “penduricos”, brinquedos luminosos e sonoros de toda ordem, para que suas crianças fiquem quietas e ocupadas, quando na verdade ficam ansiosas e inseguras, indecisas ao escolher entre tantas tralhas que lhes são oferecidas. Um pouco mai adiante, quando o aparelho visual e auditivo destas mesmas crianças está mais estruturado e em franco desenvolvimento, para que as crianças não “importunem” seus pais com suas naturais e espontâneas dúvidas e perguntas, elas são socadas diante de um aparelho de TV e posteriormente mergulhados no universo dos jogos eletrônicos que, em geral, estimulam o desenvolvimento de um comportamento agressivo e uma mentalidade descartável, pois, não vencendo é só começar de novo, e assim sucessivas vezes, até que todas as fases do jogo sejam superadas.
            Desse modo, incapazes de educar seus filhos e fornecer-lhes valores sólidos e positivos, as famílias terceirizam a educação de suas crianças, introduzindo-as, cada vez mais cedo, nos ambientes escolares. Nestes, as crianças encontram-se sob a tutela de professores (bem intencionados é verdade, que assim como os pais que, apesar de “não terem tempo”, querem sempre o melhor para suas crianças) estressados e oprimidos por uma carga horária de trabalho desumana, turmas excessivamente numerosas, o que impossibilita que dê a atenção necessária a cada pequeno (mas complexo) ser humano que está a sua frente, além de completamente desmotivados pela desvalorização social, cultural e financeira de sua fundamental mas esquecida profissão.
A atenção dos estudantes, na sequência de sua vida escolar, funciona no ritmo da programação televisiva, 3 minutos de atenção focada e 7 minutos de “intervalo”, o que não diferente do restante da população. O toma lá, dá cá dos jogos de vídeo-game permanece no jogo social, pais culpam os professores por seu fracasso na educação de seus filhos, professores culpam os estudantes por seu fracasso pedagógico e estudantes culpam pais e professores por sua incapacidade criativa em escapar da escravidão mental na qual estão atolados até o pescoço. De modo extremamente hipócrita, todos fazemos enorme alvoroço, quando ouvimos as notícias de um indivíduo desesperado e fora de controle (produto do sistema social) que invadiu uma escola ou universidade com uma arma em punho e ceifou a vida de vários inocentes, ou a notícia de um louco desvairado que assassinou várias pessoas porque não simpatizava com a cor de sua pele ou sua opção sexual, ou outro destes absurdos com os quais já estranhamente nos acostumamos e naturalizamos. Contudo, não nos esqueçamos jamais que a violência e a crueldade não passam de conseqüências lógicas da injustiça sistemática a qual diariamente todos nós estamos submetidos, somos algozes de nossos próprios destinos, padecemos porque não temos coragem de assumir as rédeas de nossas existências em nossas próprias mãos. Até quando permitiremos que o absurdo seja a lógica sob a qual nossas existências se edificam (ou se consomem como poeira que se dissipa no vácuo)? Até quando senhoras e senhores? Até quando? Já basta, um pouco de lucidez, equilíbrio, juízo, consciência e bom-senso, por favor!



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