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segunda-feira, 17 de setembro de 2012

A rede de relações:



Capra e a interdisciplinaridade

Tatiana Palm


Como disse o filósofo e poeta Kalil Gibran, nossos filhos e filhas não são nossos, vem através de nós, mas não de nós. Eles e Elas são filhos e filhas do mundo. Então quem seremos nós nesta relação?! Educadores. Seja enquanto pais, seja enquanto profissionais, o nosso papel é de educar, e, atualmente, educar nossos filhos e filhas tornou-se um grande desafio. Qual nosso verdadeiro papel enquanto pais e mães, educadores, enfim, cuidadores, dos filhos do nosso tempo (tempo de um modo de vida insustentável), da nossa época (cientifica e industrial), deste momento histórico (em transição)? Em um vôo do meu pensamento, na leitura que fiz do livro A teia da vida de Capra, encontrei uma resposta, resposta que, talvez, satisfaça apenas a mim mesma, mas afinal, isso importa? Deveras, não!


A proposta central do livro “A teia da vida” é apresentar a nova compreensão da natureza da vida que, por sua vez, gera a mudança de paradigma. As descobertas da física e da biologia que aconteceram durante as três primeiras décadas do século passado geram uma mudança na compreensão de mundo, ou seja, ocasionaram uma mudança na percepção da realidade. As descobertas revolucionarias da física quântica no que se refere aos átomos e as partículas subatômicas confirmam as desconfianças anunciadas dos estudiosos da biologia organísmica e dos psicólogos da Gestalt: os sistemas vivos, os ecossistemas, enfim, o mundo vivo é uma rede de relações nunca dissociada de contextos. Nesse sentido, as propriedades de um sistema vivo (todo) resultam das interações e das relações entre as partes. As propriedades das partes que compõem uma rede não são propriedades intrínsecas, mas apenas podem ser compreendidas em relação ao todo (Capra, p. 41). É nesse sentido que na rede de relações o contexto é essencial. Explicar coisas levando em conta o seu contexto significa explicá-las dentro do seu todo.

Entretanto, qual é a relação disso tudo com a educação? Com o ato de educar? Há uma intima relação, pois,ao educar devemos levar em conta a questão da teia de relações (essência do que é vivo). Como disse Capra “durante milhares de anos, os cientistas e os filósofos ocidentais tem utilizado a metáfora do conhecimento como um edifício (...) falamos em leis fundamentais, princípios fundamentais, blocos de construções básicos e coisas semelhantes, e afirmamos que o edifício da ciência deve ser construído sobre alicerces firmes” (idem, p. 47). Diante da compreensão de que o mundo vivo é uma rede de relações a metafora do conhecimento como um edifício cai por terra. E, “quando percebemos a realidade como uma rede de relações, nossas descrições também formam uma rede interconectada de concepções e de modelos, na qual não há fundamentos”. (idem, p.48).


De modo similar, a educação, levando em conta o desenvolvimento das ciências, foi se organizando em diferentes disciplinas escolares, as quais se relacionam com a sua ciência de referência, disciplinas que, por sua vez, são compreendidas como se fossem gavetas de um grande armário. É chegada a hora de repensar, diante do novo paradigma, também as velhas concepções educacionais. Quando a noção de rede de relações é aplicada à educação temos o fato que nenhuma disciplina é mais importante do que as outras, uma disciplina não pode mais ser vista como mais fundamental do que a outra. Como não há fundamentos na rede, a explicação dada pela física, pela matemática ou por português não são mais fundamentais do que aquelas dadas, por exemplo, pela filosofia, pela história ou pela sociologia. Mais do que isso, ao se aceitar que o que existe, efetivamente, é uma rede de relações, então, todas as concepções e teorias são igualmente verdadeiras, são versões de uma mesma realidade ou, nas palavras de Capra, um conhecimento limitado e aproximado e não uma compreensão completa e definitiva da realidade. Portanto, os educadores nunca podem acreditar estar na posse de uma verdade, mas sim de um conhecimento aproximado, provisório, transitório, e que é o que é porque possui uma relação com os outros “conhecimentos aproximativos” dentro de um determinado contexto. Acredito que compreender isso é entender o principio básico da interdisciplinaridade que deficientemente se anda aplicando por ai.
Penso que a interdisciplinaridade, compreendida como um movimento que visa superar a disciplinaridade, é o caminho para que, de fato, exista uma educação condizente com o nosso tempo, tempo de vida conectada, de rede de relações, tempo em que se confirma, como no caso da descoberta do Bóson de Higgs, que não somos nada isolados, somos na relação. O que vale mesmo não é a parte que somos, mas o tipo de relações que temos com os outros, com a natureza, com o mundo. É das relações que, enquanto parte, temos, que podemos evoluir e mudar o nosso mundo.
Capra F., A teia da vida, Ed. Cultrix - SP, 1996




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