Se
formos para o Egito, certamente, é para conhecer as pirâmides que mais do que
túmulos de faraós (como apendemos na escola) são templos de iniciação. Em
frente à grande pirâmide de Giseh, voltada para o sol nascente, nos depararemos
com a esfinge. Ao olhar para este grandiosa imagem, o que nos viria à mente? O
que ela, efetivamente, simboliza (representa)? A esfinge, comumente, é sinônimo
de enigma indecifrável, mas, como coloca Pierre Weill, tudo indica que ela era
a guardiã simbólica dos segredos iniciáticos. No Egito antigo, existiam as
escolas dos mistérios, com ritos secretos, que, primeiramente, o filósofo
pré-socrático Tales entrou contato e, seguindo o mesmo caminho, Pitágoras e
Platão. As escolas dos mistérios se localizavam junto aos templos situados ao
longo do rio Nilo e, em seu interior, transmitia-se o conhecimento das coisas
celestes e divinas, um saber acerca de si e do todo que, na verdade, não era
disponível e acessível a qualquer um. Nos templos existiam os sacerdotes (que eram
os mestres) e ao redor deles se formava um círculo fechado de conhecimento, o
círculo dos discípulos e iniciados, os quais recebiam informações e instruções
práticas, treinamento (por meio de exercícios), e, provas (práticas) que
visavam avaliar a apropriação do conhecimento e regulavam o acesso gradativo a
níveis de conhecimento cada vez mais elevados. A educação sacerdotal, portanto,
não se limitava em transmitir o conhecimento teórico e simbólico, mas também
envolvia um conhecimento obtido por meio do cultivo de si que deve se refletir
mediante atitudes em relação a si mesmo e posturas diante dos outros, da vida e
do cosmos.
Nesse
sentido, podemos dizer que os segredos iniciáticos, “eram comunicados,
juntamente com uma prudente modelagem do comportamento no sentido de um domínio
dos condicionamentos pelo homem”, ou seja, mediante a demonstração (do
iniciado) de um domínio e aperfeiçoamento de si que, em última instância, se
manifesta como o equilíbrio mediante a dualidade existente tanto no universo
(macrocosmos) como na vida (microcosmos). O equilíbrio que se encontra através
dos pares de opostos é simbolizado pela base da pirâmide de Giseh e,
certamente, obtido pelo crescimento espiritual do iniciado na escola egípcia,
que, por sua vez, está simbolizado na esfinge, guardiã da pirâmide de Giseh,
virada para o lado do sol nascente, isto é, voltada em direção à fonte da
energia solar, para o lado da luz. Segundo a tese que Pierre Weill apresenta em
seu livro “Esfinge: estrutura e símbolo do homem”, a esfinge de Giseh
representa, para além do que colocamos aqui, a evolução consciente do homem, e,
assim sendo, simboliza uma mensagem para as gerações futuras. É isso,
precisamente, o que procuramos esclarecer em seguida.
A
esfinge é um símbolo que pertence a diferentes tradições, porém, aqui nos
limitaremos a comentar sobre o que ela representa na tradição egípcia, já que a
esfinge de Giseh, é considerada a mais antiga que conhecemos até hoje. A
esfinge egípcia compõe-se de três elementos: cabeça humana, corpo de leão e
serpente. Há esfinges, geralmente, as mais recentes, que possuem quatro
elementos: o leão ou o boi, a figura humana, a águia e a serpente. Para compreender a tese apresentada por Pierre
é preciso explorar o significado de cada parte que compõe a esfinge, mais
exatamente, a cabeça de homem, o corpo de leão e, por fim, a serpente que, em
tamanho minúsculo relativamente ao corpo, aparece localizada no centro da
testa. Os animais, de modo geral, são usados como símbolos representativos da
nossa vida instintiva, da nossa animalidade, mas não é o caso da serpente, pois
aqui ela representa a sabedoria e, enquanto tal, conduz a um estado de
consciência mais elevado – nos torna divinos.
A
esfinge, enquanto um modelo evolutivo do homem, nos indica que em todo ser humano
há um animal, ou vários, já que, conforme mencionamos, algumas esfinges como,
por exemplo, nas Assírias e Persas, possuem além dos elementos da esfinge
egípcia, o boi e águia. O boi (o touro) é um animal ruminante que simboliza o
instinto agressivo e sexual. A águia,
por sua vez, simboliza para os antigos, a visão apurada, isto é, a
inteligência, a mente, poder e domínio dos instintos, a liberdade. Já o leão
representa a impulsividade, o sentimento, o coração, enquanto que a serpente,
que aparece em todas as civilizações antigas, é o símbolo da energia (força)
criadora (inclusive sexual), do saber e poder supremo e, assim, da
transcendência. A animalidade, no entanto, deve ser dominada para que possamos
despertar o poder da serpente e, portanto, atingir estados mais elevados de
consciência.
Ao
nos limitarmos aos elementos presentes na esfinge de Giseh, podemos dizer que a
evolução do ser humano se dá na medida em que ele se sobrepõe ao animal que
todo homem tem em si. A força do leão deve ser dominada pela inteligência
humana. Somente quando os instintos relacionado a geração e conservação da vida
e, além disso, as reações automáticas (as emoções) forem controladas podemos
evoluir. Para abandonar a animalidade, para elevar-se da condição de
animal é necessário ter controle sobre si, o qual, por sua vez, pode ser
aprendido. Entretanto, o controle sobre o instinto (de defesa) e o domínio dos
sentimentos que podem ser efetuados pela inteligência (pensamento) não são
suficientes. A própria inteligência ou mente deve ser treinada para que possa
atingir a transcendência. De outro modo e mais detalhadamente, podemos dizer
que o homem é capaz de aprender e dominar o leão que representa as paixões, o
boi que representa nossa vida sexual e orgânica bem como a águia que representa
a nossa mente (pensamentos). É dessa maneira que ele pode dominar a energia
criadora (da serpente) e isso faz com que ele transcenda a condição de humano. Na
medida em que alcança o controle da energia suprema, atingirá, então, a
felicidade e a serenidade espiritual dos deuses, expressada no semblante da
própria esfinge antes dela ter sido desfigurada por várias batalhas.
Tanto
a inteligência (mente) humana quanto o leão (instinto/emoções) e a serpente (energia
criadora) representam, portanto, três forças da natureza que o homem precisa
ter consciência e aprender a controlar para assim tornar-se um ser superior, ou
ainda, um ser iluminado. É através da evolução, que passa por três estágios:
pelo controle das reações automáticas, domínio da mente e do uso consciente da energia,
que o homem pode atingir a iluminação. É inevitável aqui lembrar do yôga. Este
caminho visa justamente alcançar a iluminação por meio de uma aperfeiçoamento do
ser humano, logo, está intimamente relacionado com a descrição e o significado
que aqui apresentamos da esfinge egípcia. Entretanto, isso será assunto para um
outro textos. Agora, simplesmente queremos finalizar dizendo que, do pont de
vista de Pierre Weill, a mensagem que a esfinge de Giseh transmite para as
gerações vindouras é a do “vir a ser’ do homem. O homem pode superar a própria
animalidade e ter controle consciente de si e da sua energia e assim tornar-se
um ser superior (divino). Este “vir a ser”, na verdade, está em suas próprias
mãos.
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